quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Quase


Ele conversava em sua própria mente,
Ali não tinha medo de nada.
Criava e inventava sons,
Trocava as cores, dobrava o céu,
Estimulava na boca o gosto do mel.
Sorria sem fim,
Sem tempo,
Sem eco.

Reposicionava as pessoas como se fossem brinquedos.
Era livre, tinha um tigre, não tinha cabelo e não sentia frio.
Diminuía, crescia, batia no chão igual borracha.
Não se machucava, não dormia, não sentia fome e nem dor.

Esticava-se, questionava as pessoas sobre a vida,
Formulava as respostas logo em seguida,
Ia formando um paredão sem fim de perguntas não respondidas.
Não entendia a maldade humana,
Desconhecia o que era solidão.

Cantava e dançava sempre em grandes companhias,
De Pinóquio a Chico, de Colombo a Lampião.
Quem pesava a pena, do chumbo espantava.
Corria sobre os rios, patinava sobre o mar.
Transformava vinho em água, coloria a escuridão.

Só não conseguia amolecer os jovens corações tão duro quanto pedras, que estão escondidos atrás de rostos maquiados que celebram com gratidão a ingrata mentira que acreditam ser uma possível verdade em meio a um labirinto de placas mal sinalizadas.

Jonatas Pierre


terça-feira, 9 de outubro de 2012

In Tenção

Como entender aquilo que não se vê?
O sol do alto brilhando em todas as direções
Um imã central atraindo matérias
A linha do horizonte sem fronteiras
Cores que atravessam montanhas
Sem início e sem fim.

Barulhos rangendo sem identificação
Clarões em linhas distorcidas no meio da escuridão
São ventos, são lágrimas, são gritos, são dores
São espelhos velhos com vidros novos
Renovando reflexos em cada geração.

Roupas novas e sorrisos falsos
Que embalam a falsa impressão de uma nova estação
Máscaras de aço em grande produção
Que alimentam a alma e enchem os corações de esperanças e enganos
Delineando em planejadas expressões
Uma marcha em movimento retilíneo uniforme
Que caminha para onde quiser que vá a intenção.

Jonatas Pierre

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Rede

Ele não usou lenço hoje, não leu jornal, não penteou os cabelos, não colocou o suspensório. Não saiu, não sorriu e não comeu. Ficou deitado na rede de pijama azul, olhando para o tempo, contando as nuvens, lembrando-se dos eventos que naquele dia rechearam a sua agenda.

Não quis ir, quis ficar aqui esperando o sol se por. Há muito tempo não parava para olhar o por do sol. Casa, trabalho, trabalho, escola, em um ritmo indeterminado. Hoje lhe deu férias, não fez a barba, não cortou as unhas, não trocou ‘bom dia’.

Deitou ali, sem pensar nas horas, sem lutar com o trânsito, sem contar os dias. Ficou sem internet, sem celular e sem TV. Escutou o silêncio, sentiu o vento e não parava de bocejar. Era homem, era natural, era um ser tão ser quanto outro ser.

Olhou sem pressa, respirou tranquilo, não franziu a testa. Descansou, sentiu no corpo e na mente o alívio de ainda ser gente. Gritando por de trás de uma casca moldada a ganância ainda existia uma alma, sufocada pela corrente crescente pra frente de uma futilidade sem fim. Carente alma de simplicidade e amor, exibindo seus raios puros no balançar de uma rede em um dia sem horários, sem medo, sem lente e sem dor.

Jonatas Pierre